Episodios

  • Qual é o sentido da vida? António Castro Caeiro
    Jul 2 2025
    Perguntar, perguntar, perguntar. Passar a vida a fazer perguntas. Passar todo o tempo do mundo em busca de respostas. Perguntas das mais difíceis. Respostas que podem nem chegar. É a vida dos filósofos. E decidi convidar um dos melhores. Eu faço perguntas. António Castro Caeiro traz respostas. Vivemos num tempo acelerado, de respostas rápidas, notificações constantes e poucas pausas para pensar. A informação chega em excesso, a comunicação tornou-se instantânea e, muitas vezes, vazia. Perguntar parece ter-se tornado um ato quase subversivo. Questionar o mundo, o tempo, a vida, até a nós próprios, pode soar estranho, deslocado ou até incómodo. Mas talvez seja justamente esse desconforto que precisamos de recuperar. É nesse gesto simples e revolucionário — o de fazer perguntas — que entra a filosofia. Neste episódio do Pergunta Simples, falamos com António Castro Caeiro. É professor universitário, tradutor, ensaísta e uma das vozes mais singulares da filosofia contemporânea em Portugal. Mas mais do que títulos, Caeiro é alguém que pensa o mundo com palavras, com o corpo e com uma atenção rara às perguntas certas. Convida-nos a desacelerar, a escutar, a habitar o tempo e a linguagem com mais cuidado. Nesta conversa, há espaço para dúvidas sem fim, para silêncios reveladores e para a beleza difícil das ideias que resistem à simplificação. Ao longo da conversa, exploramos o papel essencial da pergunta. O que é uma boa pergunta? Por que nos incomodam as perguntas que não têm resposta imediata? Porque é que, muitas vezes, evitamos perguntar — como se a dúvida nos fragilizasse? Para Caeiro, a pergunta é mais do que uma forma de obter informação. É um exercício de atenção, uma forma de estar no mundo. Perguntar bem é escutar com rigor, pensar com tempo e resistir à facilidade de respostas prontas. Vivemos, como diz, entre o espanto e a dúvida — duas formas de nos abrirmos ao desconhecido, ao imprevisto, ao que escapa às fórmulas. Mas este episódio vai muito para além das perguntas. Falamos de emoções, sentimentos e corpo. Num tempo em que nos pedem performance constante — em que se valoriza a eficiência, a imagem e a exposição — é urgente recuperar a dimensão sensível da existência. António Castro Caeiro defende que as emoções não são um desvio do pensamento, mas parte do próprio acto de pensar. Sentir é também uma forma de compreender. E o corpo — tantas vezes visto como mero suporte — é, na verdade, um centro de inteligência e perceção. Nesta conversa, revisitamos o espanto original com que olhámos o mundo pela primeira vez: o primeiro mergulho no mar, o primeiro amor, o primeiro espanto perante uma paisagem. A vida, diz-nos, vai-nos calejando — e cabe-nos, através da filosofia, da arte ou da contemplação, reencontrar esse olhar inaugural. É esse o desafio: não viver em modo automático, mas reativar a atenção, a curiosidade, a capacidade de nos maravilharmos. Também há tempo para refletir sobre o tédio — esse vazio que tantas vezes evitamos a todo o custo. Vivemos rodeados de ocupações, estímulos, distrações. Mas talvez o tédio, se escutado com atenção, seja um convite à criação, à escuta interior, ao reencontro com o essencial. Talvez seja no silêncio, na pausa, no vagar, que se abra espaço para a filosofia. Não ignoramos os temas contemporâneos: as redes sociais, a exposição constante, a fragmentação da identidade. Falamos do eu digital e das versões idealizadas que projetamos ‘online’. Mas também reconhecemos que o virtual é tão antigo quanto a humanidade — sempre vivemos com imagens, memórias, fantasias e projeções. A novidade, talvez, seja a velocidade e a intensidade com que tudo acontece. Por fim, chegamos à pergunta que dá nome a este ‘podcast’: ainda faz sentido perguntar pelo sentido da vida? Num mundo líquido, ambíguo, saturado de opiniões e urgências, onde encontramos pontos de apoio? António Castro Caeiro não nos dá respostas fechadas, mas aponta caminhos: o da escuta,
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    55 m
  • O que torna um professor inesquecível? José Oliveira
    Jun 25 2025
    Todos guardamos a memória de um ou dois professores que nos marcaram. Não nos lembramos das notas, nem dos nem do que projetaram ou escreveram no quadro, nem dos testes. Lembramo-nos do olhar atento no dia certo. Da pergunta inesperada. Da confiança plantada como quem diz: “Tu consegues.” São esses professores que ficam. Porque nos viram antes de nós sabermos quem éramos. Porque nos empurraram um pouco mais longe do que imaginávamos possível. E, porque, mesmo sem saberem, mudaram a curva da nossa vida para sempre. Esta conversa é, também, um tributo a todos eles. Ensinar é uma arte enigmática. Incompreensível para mim. Importante para todos. Uma arte feita de gestos invisíveis, sementes lançadas ao vento, perguntas que nunca terão resposta imediata. Ensinar é um ofício de fé. Acredita-se que, um dia, aquilo que hoje foi dito, desenhado, percebido — possa fazer sentido para alguém. E que, talvez, esse alguém seja melhor por causa disso. Hoje, no Pergunta Simples, sentamo-nos com um professor que leva essa arte a sério. Sério como quem ri, como quem experimenta, como quem acredita. José Oliveira, professor de Artes na Escola Secundária Francisco Rodrigues Lobo, em Leiria. Mas, acima de tudo, um construtor de mundos. Transformou uma disciplina técnica, aparentemente árida — a Geometria Descritiva — num laboratório de criação. E foi por isso que este ano recebeu o prémio que distingue o melhor professor do país. Mas esta conversa não é sobre um prémio. É sobre aquilo que ninguém vê quando se fecha a porta de uma sala de aula. É sobre como se cria um espaço onde cada aluno tem lugar, tempo, voz, desafio e superação. Onde os erros não são falhas, mas parte do processo. Onde os alunos aprendem com os colegas, e os professores aprendem com os alunos. Onde se ensina com papel, com madeira, com palavras, com copos coloridos, com silêncios e com perguntas. Onde a aprendizagem não parte de um programa, mas de um princípio simples: Ensina-se a partir do ponto onde o outro está. E não onde um qualquer teórico dos programas escolaes imagina que estamos. José Oliveira fala como quem pensa a escola com as mãos. Fala da arte, da matemática e da tecnologia como instrumentos de pensamento. Critica os exames, os programas, os formalismos — mas sem amargura. Fala da educação com uma alegria serena, de quem sabe que ensinar não é cumprir um plano, é acender alguma coisa em alguém. E, pelo meio, diz frases que ficam: Que a geometria descritiva é uma matemática desenhada. Que a escola não deve nivelar por baixo — nem por cima — mas puxar cada aluno para o seu máximo possível. Que nem sempre quem chumba é quem menos sabe — às vezes é quem mais foi abandonado. E que o grande erro da escola moderna é esquecer que cada cérebro tem o seu tempo, a sua forma, a sua origem. Esta conversa podia ser ouvida numa sala de professores, numa oficina de serigrafia ou num comboio entre Setúbal e Leiria. Mas o lugar certo para a escutar é onde estiver alguém que ainda acredita que a escola pode mudar vidas. Que ainda acredita que um professor não é só um transmissor de conteúdos — mas alguém que planta inquietações, liga mundos, abre caminhos. José Oliveira não veio defender um método. Veio lembrar-nos que ensinar é uma forma de cuidar. E que talvez o futuro da educação não conste nos manuais, nem nas grelhas, nem nos ‘rankings’. Talvez esteja ali, no fundo da sala, onde alguém com um copo vermelho na mão — qual semáforo — porque não entendeu o que lhe disseram — espera que lhe perguntem: “Vamos tentar outra vez?” Vamos a isso? Todos nos precisamos de bons professores. Na escola e na vida toda. E precisamos de que haja professores com arte e engenho para nos encantarem no caminho. O que definitivamente não precisamos é de exames escritos deliberadamente para não serem entendidos ou de um sistema educativo que descarta ...
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    55 m
  • Como fazer rir? Gabriela Barros
    Jun 18 2025
    Gabriela Barros fala sobre humor, representação e vulnerabilidade numa conversa intimista e divertida. Do Taskmaster ao Pôr do Sol, exploramos o que é preciso para fazer rir com precisão. Uma atriz com ritmo, verdade e escuta, num episódio essencial do Pergunta Simples sobre a arte de estar em cena.
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    51 m
  • Como fazer uma boa apresentação em público?
    Jun 11 2025
    Há pessoas que falam. E há pessoas que, quando falam, fazem parar a sala. A diferença não está no tema — está na forma como se ligam ao público, como seguram o silêncio, como estruturam o que dizem. Todos, mais cedo ou mais tarde, temos de apresentar algo em público. E poucos aprendem verdadeiramente como o fazer bem. Neste episódio, partilho convosco o essencial: como preparar, estruturar e apresentar uma mensagem com impacto. Com base na prática, na ciência e nas histórias de quem sabe falar para ser ouvido. Falar em público dá medo. Simples. Mesmo para quem tem experiência. Mas a verdade é que comunicar bem é uma das ferramentas mais poderosas que existem. Este episódio é um guia completo. Vamos falar de: • Como preparar uma apresentação • Como estruturar a mensagem • Como ganhar confiança • Como falar com naturalidade • Como adaptar-se à audiência • E o que fazer após sair do palco No fim, como sempre, deixo uma lista prática com 10 erros a evitar e 10 boas práticas obrigatórias. Vamos começar por onde tudo começa: a preparação. Falar em público dá medo. Simples. Mesmo para quem tem experiência. Mas a verdade é que comunicar bem é uma das ferramentas mais poderosas que existem. Este episódio é um guia completo. Vamos falar de: • Como preparar uma apresentação • Como estruturar a mensagem • Como ganhar confiança • Como falar com naturalidade • Como adaptar-se à audiência • E o que fazer depois de sair do palco No fim, como sempre, deixo uma lista prática com 10 erros a evitar e 10 boas práticas obrigatórias. Vamos começar por onde tudo começa: a preparação. Preparação: a base de tudo Nada acontece por acaso numa boa apresentação. A preparação é aquilo que ninguém vê, mas que faz toda a diferença. É onde se ganha (ou perde) a confiança, a clareza e a força da mensagem. Um bom comunicador começa a trabalhar muito antes de subir ao palco — e isso nota-se. Neste bloco, falamos sobre como definir o objetivo da apresentação, conhecer bem o público, organizar ideias com clareza e ensaiar com método. Antes de abrir a boca, há perguntas que tens de saber responder: • Qual é a ideia principal que queres passar? • A quem vais falar? O que valorizam? • Porque é que esta apresentação importa — para ti e para eles? Dica: escreve a tua ideia central numa frase. Se não consegues, ainda não está clara. Prepara-te a sério: • Estuda o tema • Escolhe exemplos concretos • Ensina como se estivesses a falar para alguém que quer mesmo perceber Ensaiar é obrigatório. Steve Jobs ensaiava as suas apresentações como um maestro. A regra de Carmine Gallo: repete tudo em voz alta pelo menos 10 vezes. No próprio dia: • Dorme bem • Respira fundo • Lembra-te: não estás ali para impressionar, estás para ser útil Agora que estás preparado, vamos estruturar a tua apresentação para que a mensagem seja clara e envolvente do princípio ao fim. Estrutura: início, meio e fim Se a preparação é o alicerce, a estrutura é a arquitetura da apresentação. É ela que dá forma à mensagem, que orienta quem fala e quem ouve, e que impede que o discurso se perca ou se arraste. Uma estrutura simples pode fazer maravilhas. Aqui explico como criar uma abertura que prende, como organizar o corpo da apresentação em três ideias principais e como terminar com impacto e clareza. Uma apresentação precisa de ter forma. Senão, ninguém se orienta. Pensa assim: Começo forte • Frase marcante • Pergunta provocadora • Pequena história pessoal Corpo da apresentação • 3 ideias principais • Cada ideia com 1 exemplo • Ligações claras entre os blocos Conclusão • Recapitula a mensagem principal • Deixa um apelo ou uma imagem forte Dica: usa contrastes. Mostra o "mundo como está" e depois o "mundo como poderia ser". Isso dá ritmo e chama a atenção. Com a estrutura definida, é hora de pensar na entrega: a forma como vais dar vida às...
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    17 m
  • Como Fazer Boas Perguntas?
    Jun 3 2025
    Há perguntas que mudam tudo. Mudam o rumo de uma conversa. Mudam uma decisão. Às vezes, mudam mesmo uma vida. A tua. Ou a de alguém que te ouviu perguntar no momento certo. Mas o que é, afinal, uma pergunta poderosa? Não é uma pergunta para parecer esperto. É uma pergunta que cria espaço. Espaço para o outro pensar. Para se ouvir. Para ver com mais nitidez. Vivemos rodeados de respostas apressadas, diagnósticos de bolso e certezas com prazo de validade de 30 segundos. Mas talvez o mais transformador — hoje mais do que nunca — seja isto: Fazer uma pergunta com verdadeira curiosidade. Hoje falo-te disso. Do poder da pergunta certa. De como se faz. E do que ganhamos quando deixamos de querer saber tudo — e começamos a querer entender melhor. O que é uma pergunta poderosa? Não é técnica. Não é estratégia. É uma forma de estar. É uma pergunta que não invade, não obriga, não empurra. É leve no gesto, mas profunda no efeito. Não tenta mostrar o que tu sabes. Tenta revelar o que o outro ainda não tinha visto. Ou o que talvez já soubesse — mas ainda não tinha dito em voz alta. E quase sempre… são perguntas simples. – O que é que ainda não foi dito? – O que te parece que te está a travar? – O que mudou, desde que começaste a pensar nisto? São perguntas que, quando bem feitas, não assustam. Desarmam. E o mais curioso é que não têm resposta imediata. Porque fazem pensar. Queres experimentar? Pensa numa decisão recente em que hesitaste. Agora, pergunta-te: “Se eu não tivesse medo… o que faria?” Fica aí. Vê o que aparece. Não forces. Só escuta. Este é o efeito de uma boa pergunta. Não resolve. Mas revela. E às vezes, é tudo o que precisamos. As perguntas que puxam por nós… e as que nos encolhem Já estiveste numa reunião onde alguém pergunta: “Porque é que ainda não trataste disto?” O ambiente muda. O corpo encolhe. A resposta encolhe. A conversa fecha. Agora imagina o mesmo momento, mas com outra pergunta: “O que te está a bloquear?” Ou: “O que é que ainda precisas para avançar com isto?” O conteúdo pode ser o mesmo. Mas o tom, o impacto e a disposição do outro… são totalmente diferentes. Há perguntas que abrem. E há perguntas que fecham. E depois, há aquelas perguntas que parecem neutras — mas são só julgamentos com ponto de interrogação no fim: “Não achas que devias ter feito diferente?” “Estás mesmo certo disso?” “Porque é que só falaste agora?” Estas perguntas não querem saber. Querem vencer. E quando sentimos isso, protegemo-nos. A pergunta poderosa, ao contrário, não exige resposta certa. Cria espaço para uma resposta verdadeira. Como se aprende a perguntar melhor? Como tudo o que importa: com prática. Fazer boas perguntas não é talento. É treino. É afinação. É como afinar o ouvido para a música. Ou o paladar para o vinho. Começa por escutar. Por reparar. E por parar de querer ter razão. Exercício simples: Escolhe uma conversa que vai acontecer esta semana — uma reunião, uma conversa difícil, um jantar. Prepara duas perguntas que gostavas de fazer. Só isso. Mas faz isto: – Escreve-as antes. – Lê-as em voz alta. – E pergunta a ti próprio: isto convida ou acusa? Se a pergunta for sincera — leva-a contigo. Se for uma opinião disfarçada de pergunta… deixa-a em casa. Outra prática que resulta bem: quando deres por ti prestes a dizer “eu acho que…” — trava. E tenta isto: “O que te faz pensar assim?” “Queres contar-me como chegaste a essa conclusão?” Ao fazer isso, estás a trocar julgamento por curiosidade. E a curiosidade é a argamassa de qualquer conversa que quer durar. A pausa como parte da pergunta Sabes o que quase ninguém faz? Esperar. Fazemos uma pergunta — e se o outro não responde em dois segundos, avançamos. Fazemos outra.
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    15 m
  • Como nasce uma mentira com cara de verdade? Filipe Pardal
    May 28 2025
    No mundo novo, a verdade e a mentira parecem valer o mesmo.As falsidades travestidas de notícia contaminam a nossa confiança e a manipular as nossas formas de ser e estar.Um programa cujo mote principal é: ver, entender e resistir.E não, não são simples boatos ou pantominas.São atos deliberados de comunicação para manipular, para enganar.Há que estar atento. A ameaça é séria. Há coisas que só acontecem quando tudo se apaga. Quando o mundo à nossa volta fica em silêncio. Quando as luzes falham. Os dados caem. Os telefones deixam de dar sinal. E o ecrã — esse ecrã sempre aceso — de repente fica negro. Há um par de semanas. Um apagão elétrico, nacional, deixou milhões de pessoas sem energia. Durante horas. Sem rede, sem ‘internet’, sem televisão, sem rádio. E foi precisamente nesse vazio — nesse momento em que todos esperávamos respostas — que alguém decidiu criar uma mentira. Não uma daquelas que costumam vir de fora. Importadas, traduzidas, adaptadas. Não. Pela primeira vez, nasceu aqui. Uma fake news portuguesa. Made in Portugal. Com uma estrutura clássica: citava a CNN Internacional, punha palavras falsas na boca da presidente da Comissão Europeia, falava de um ataque cibernético russo. E o mais impressionante: funcionava. Porque parecia verdadeira. Porque tinha fonte. Porque tinha aspas. Porque aparecia bem escrita. E porque o momento era propício. O país estava vulnerável. E a mentira encontrou o espaço perfeito para crescer. A desinformação não precisa de muito para se espalhar. Só precisa de parecer plausível. De encaixar na emoção do momento. De tocar naquele nervo exposto. E isso basta. Este episódio começa aqui. Com Filipe Pardal, diretor de operações do Polígrafo e dirigente da rede europeia de verificação de factos, a European Fact-Checking Standards Network, fazemos a autópsia dessa notícia falsa. E de muitas outras. Desmontamos a anatomia de uma mentira. E tentamos responder à pergunta que não quer calar: por que é que acreditamos nisto? A conversa é tudo menos técnica. É direta, desassombrada, útil. O Filipe conhece o fenómeno por dentro. E partilha connosco um conhecimento raro: o de quem passa os dias a ler frases suspeitas, a verificar factos, a desmontar falácias — e a lidar com o ódio que isso provoca. Falamos do termo fake news — que, é uma contradição em si mesmo. Porque uma notícia, para o ser, tem de ser verdadeira. E o que é falso… não é notícia. É desinformação. Ou, se quisermos, um boato — palavra antiga, que talvez descreva melhor o que enfrentamos hoje. Mas o que enfrentamos, afinal? Falamos de plataformas de desinformação profissional, com ligações a interesses geopolíticos. De fábricas de trolls ( uma espécie de robôs da internet, ou excertos de pessoas, que operam como agências — com orçamento, estratégia e objetivos. De vídeos falsos criados por inteligência artificial. De notícias recicladas com novos títulos. De imagens antigas vendidas como atuais. De WhatsApp s de família onde as mensagens falsas correm mais rápido do que em qualquer rede aberta. E falamos de outra coisa: da nossa fragilidade emocional. Porque o problema da desinformação não é só tecnológico. É humano. É psicológico. A mentira cola porque é simples. Porque confirma o que queremos acreditar. Porque nos poupa o esforço de duvidar. Vamos aprender como se combate isso. Com factos, sim. Com verificação. Mas também com literacia digital. Com transparência. Com ética jornalística. E com uma ideia clara: quem afirma um facto tem de o poder provar. Falamos também do preço de dizer a verdade. Do assédio, das ameaças, das pressões. E do cansaço de ser, todos os dias, o chato que diz “isso não é bem assim”. Mas falamos sobretudo da utilidade desse trabalho. Da sua importância para a saúde da democracia. Porque, como diz o Filipe: “Todos têm direito à sua opinião. Mas ninguém tem direito aos seus próprios factos.” Esta frase, simples e poderosa, resume o espírito do episódio.
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    1 h y 8 m
  • Que histórias ainda não ousámos contar? Filipa Martins
    May 21 2025
    Filipa Martins esteve na Ucrânia em plena guerra. Decidiu lá ir, há poucas semanas. Dormiu num bunker, ouviu sirenes de bombardeamento, escreveu com o corpo em sobressalto e regressou com uma história para contar. É a partir dessa experiência — descrita num texto publicado na revista Visão — que começa esta conversa, mas o que se segue vai muito além da crónica de uma viagem a um país em conflito. Filipa Martins é escritora, jornalista e argumentista. Publicou romances, ensaios, argumentos televisivos e, até uma biografia: O Dever de Deslumbrar, dedicada à vida e à obra de Natália Correia — um projeto de seis anos de investigação e escrita, que reconstitui o percurso de uma das figuras mais complexas e livres da cultura portuguesa do século XX. Neste episódio do Pergunta Simples, Filipa Martins fala sobre tudo isso: o processo criativo, o método, as viagens, os limites da exposição pessoal na escrita, sobre a responsabilidade de narrar vidas reais, nas biografias.. Mas fala também — e com contundência — sobre o estado da democracia, o espaço das mulheres na cultura e na sociedade, e o modo como certos retrocessos se tornam visíveis nas estatísticas, nos discursos, e até nos algoritmos das redes sociais. Ela assinou o argumento das séries Três Mulheres e Mulheres às Armas, onde a ficção histórica serve como espaço de reconstrução de memórias silenciadas — em particular, as histórias de mulheres que tiveram um papel ativo em momentos decisivos da história portuguesa, mas que a narrativa oficial nunca destacou. Na conversa, há espaço para o rigor e para a emoção. A autora explica por que razão sente necessidade de “palmilhar” o território antes de escrever — uma herança do jornalismo que molda a sua literatura. Explica também por que razão vê a escrita como um gesto de observação e de resistência — mesmo quando isso significa abrir feridas ou reescrever memórias difíceis. Falamos das notas tiradas em viagem, da organização caótica dos cadernos perdidos, da vida doméstica retratada nas redes, da romantização dos papéis tradicionais, do papel do medo e da intimidade na criação literária. Filipa Martins está, presentemente, a terminar o seu próximo romance. Não é autobiográfico, diz — mas é, até agora, o mais pessoal. Um livro que volta à memória, à linhagem feminina e às marcas que se herdam. Esta conversa é sobre tudo isto. Sobre escutar, observar e transformar o que se vive — em literatura, em pensamento, em matéria para não esquecer. LER A TRANSCRIÇÃO DO EPISÓDIO 00:00:00:00 - 00:00:03:06 Filipa Martins, Jornalista, escritora. 00:00:03:06 - 00:00:11:04 Imagino que agora te sintas mais escritora do que jornalista. Um sim, mas um género com. 00:00:11:06 - 00:00:38:06 Esta conversa que é quase uma conversa de karma, porque a primeira vez que nós tentamos, ainda na nossa santa ignorância, descobrimos que não havia luz. Na verdade, houve um apagão ibérico, na verdade mais do que ibérico, certo? Creio que esta luz não diz tudo, ainda mais sabendo que falar contigo era um enorme gosto. Mas só hoje de manhã, sabendo que vinha cá hoje na rádio, eu estava a temer que houvesse outro cataclismo que nos separasse. 00:00:38:07 - 00:01:11:01 E aí passávamos então a ser banco. Como é que tu vives? Tu paga um. Olha, na verdade foi muito agradável. Eu sei que houve situações muito complexas, mas a minha versão dos acontecimentos foi foi, foi bastante simpática. Encontrei amigos por acaso na rua, que é uma coisa absolutamente estranha em Lisboa, quase como aquela que os encontros casuais da aldeia e de repente se combinamos juntar crianças. 00:01:11:03 - 00:01:34:14 Então passámos um serão. Tivemos também a sorte de ser uma altura do ano em que em que a noite chegou bastante tarde, portanto, e até às 08h30 tivemos o lusco fusco, vendo os fusco, as crianças a subirem, encher as casas com lanternas e a brincarem com a fazer sombras chinesas na parede. Portanto,
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    54 m
  • Estamos a ouvir verdadeiramente os adolescentes? Tânia Gaspar
    May 14 2025
    Está tudo à beira de um ataque de nervos. Adolescentes, pais, professores. Já repararam que quase ninguém anda feliz com a vida que leva? Pode ser uma mera perceção minha. Mas há já múltiplos estudos que evidenciam sintomas de que o nosso bem-estar está abalado. E ninguém parece saber a receita para reequilibrar isto. Decidi assim ir em busca de respostas, com Tania Gaspar, psicóloga clínica, autora e coordenadora de múltiplos estudos sobre a saúde mental dos jovens ou o bem-estar dos pais, enquanto trabalhadores. E os resultados não são nada animadores. A saúde mental dos jovens em Portugal está sob uma pressão silenciosa, mas cada vez mais evidente. Apesar de viverem numa era de oportunidades aparentemente infinitas, muitos jovens sentem-se perdidos, sobrecarregados e emocionalmente fragilizados. Na nossa conversa Um dos temas que mais destacou foi o sistema educativo e a sua incapacidade de apoiar os alunos mais vulneráveis. Para Tânia Gaspar, a escola tornou-se um ambiente que, em vez de promover crescimento, muitas vezes contribui para o aumento da ansiedade e do insucesso. Este ciclo de exclusão começa cedo e afeta, sobretudo, os jovens de contextos socioeconómicos mais frágeis. Sem suporte emocional e estratégias de recuperação, muitos acabam por abandonar os estudos. A pandemia veio agravar estas dificuldades. As crianças que estavam no 1.º e 2.º anos durante o confinamento sofreram um corte drástico no desenvolvimento das suas competências básicas. Um estudo piloto conduzido pela equipa de Tânia Gaspar em escolas públicas demonstrou que, com intervenção personalizada e apoio emocional, grande parte dos alunos conseguiu recuperar a literacia e as competências sociais. Será que estamos a perceber os sinais? Os jovens estão emocionalmente mais frágeis. Tânia Gaspar descreve um cenário preocupante, onde as expressões emocionais muitas vezes se manifestam através de comportamentos disruptivos — agitação, agressividade ou, no extremo oposto, retração silenciosa. Estes comportamentos são frequentemente interpretados como problemas de disciplina, mas podem esconder questões emocionais profundas. O ambiente escolar, em vez de integrar essas crianças, tende a isolá-las, criando um ciclo de exclusão e retração emocional. E depois há a família. A família é um dos pilares fundamentais para o equilíbrio emocional dos jovens. No entanto, Tânia Gaspar reconhece que nem sempre existe um acompanhamento adequado. Cito uma frase que podem ouvir a seguir: “Os pais estão exaustos, sobrecarregados com o trabalho, e isso reflete-se na capacidade de ouvir e apoiar os filhos” Para a psicóloga, é urgente investir em literacia parental, para os pais compreenderem melhor os ciclos de desenvolvimento e os desafios específicos de cada idade. Ser jovem acabadinho de entrar no mercado é uma carga de trabalhos. A transição para o mercado de trabalho tem sido marcada por um misto de incerteza económica e falta de propósito. Muitos jovens sentem-se pressionados a encontrar um rumo rápido, sem espaço para experimentar ou errar. Vale aprender um conceito que se está a tornar comum entre os jovens trabalhadores: o "boreout" — o tédio crónico associado à falta de estímulo no trabalho. Além disso, muitos jovens rejeitam o modelo tradicional de carreira. Para esta geração, a ideia de escola-universidade-emprego desaparece, dando lugar a trajetórias mais fluidas, onde o propósito e o equilíbrio emocional ganham destaque. Obviamente é essencial preparar melhor os jovens para os desafios da vida adulta, promovendo resiliência emocional e literacia em saúde mental. Tania Gaspar é psicóloga e mãe de adolescentes. E observa de forma muito atento que se passa na escola dos nossos tempos. E o correr bem ou mal depende muitas vezes das condições da vida familiar e doméstica. LER A TRANSCRIÇÃO DO EPISÓDIO 00:00:36:14 - 00:01:07:20 Fazer isso, porque olha, já temos os bombeiros,
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    1 h y 8 m