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  • 30 anos do genocídio de Srebrenica: memória, justiça e paralelos com Gaza
    Jul 11 2025

    Nesta sexta-feira (11), a Bósnia e Herzegovina lembra três décadas do genocídio de Srebrenica, quando cerca de 8.372 pessoas - homens, meninos, mulheres e meninas - foram assassinadas pelas forças sérvias, em julho de 1995. Reconhecido como genocídio por tribunais internacionais como a Corte Internacional de Justiça e o Tribunal Penal Internacional para a ex-Iugoslávia, o episódio se consolidou como um símbolo da falência da comunidade internacional diante de crimes sistemáticos de extermínio.

    Giovanna Vial, Sarajevo, Bósnia e Herzegovina

    As vítimas eram majoritariamente bosníacos, grupo étnico de herança muçulmana originário da Bósnia, diferentemente do termo “bósnio”, que se refere a qualquer cidadão do país, independentemente de religião ou etnia. Foi justamente essa comunidade - os bosníacos -o alvo central do projeto genocida conduzido durante a guerra da Bósnia, entre 1992 e 1995.

    Em Sarajevo, a capital do país, dezenas de pessoas saíram às ruas na noite anterior ao aniversário do genocídio. Em uma marcha silenciosa pelo centro histórico da cidade, manifestantes empunharam bandeiras da Bósnia e da Palestina, vestiram keffyehs - lenços tradicionalmente associados à resistência palestina - e exibiram cartazes com mensagens que ligavam diretamente os crimes cometidos em Srebrenica aos que vêm sendo denunciados atualmente em Gaza.

    Entre os participantes, a estudante de medicina Ana Ibrahimović, nascida e criada em Sarajevo, contou que a marcha em solidariedade aos palestinos ocorre todos os anos na cidade. Mas, segundo ela, 2025 carrega um peso diferente.

    “O que está acontecendo em Gaza tem muitas semelhanças com o que aconteceu em Srebrenica. É como se a história estivesse se repetindo. O mundo não aprendeu a lição”, disse Ana.

    Consequências e traumas

    O genocídio de Srebrenica, ocorrido em julho de 1995, representou o ápice de uma campanha sistemática de extermínio contra os bosníacos. Antes mesmo do massacre, a cidade já estava sitiada há três anos. Durante esse período, mais de 10 mil pessoas foram mortas — vítimas de bombardeios constantes, da fome e de franco-atiradores.

    Mulheres foram aprisionadas em campos onde sofreram estupros sistemáticos. Civis foram forçados a usar braçadeiras brancas para identificação, expulsos de suas casas, enterrados em valas comuns ou, em alguns casos, queimados vivos.

    As consequências ainda se fazem sentir: milhares de corpos continuam desaparecidos, exumações seguem em curso e novas valas continuam sendo encontradas. Os sobreviventes carregam traumas físicos e psicológicos profundos. Muitas das crianças nascidas dos estupros cometidos em campos de concentração estão hoje na casa dos 30 anos, lidando com as marcas de uma história brutal.

    O caso de Srebrenica representou um marco no Direito Internacional: foi a primeira vez que um tribunal internacional - o Tribunal Penal Internacional para a ex-Iugoslávia - indiciou indivíduos por genocídio.

    Três décadas depois, a comparação com o que ocorre atualmente em Gaza ressalta a necessidade de não simplificar esses acontecimentos a meros conflitos religiosos, sob pena de apagar os projetos políticos e militares por trás das atrocidades e relativizar a responsabilidade dos autores.

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  • Enquanto líderes discutem reconstrução da Ucrânia, Zelensky pede apoio urgente à defesa
    Jul 10 2025
    Começou nesta quinta-feira (10), em Roma, a 4ª Conferência Internacional de Doadores para a Reconstrução da Ucrânia. O encontro de dois dias reúne o presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, a primeira-ministra italiana, Giorgia Meloni, o chanceler alemão, Friedrich Merz, a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, além de comissários europeus e empresários. Gina Marques, correspondente da RFI em Roma Esta é a quarta vez que líderes internacionais se reúnem para discutir a reconstrução do país. As expectativas são altas, mas o desafio financeiro é imenso: segundo o Banco Mundial, o plano de reconstrução da Ucrânia exige cerca de US$ 500 bilhões — recursos que ainda não estão disponíveis. Na abertura do encontro, a primeira-ministra Georgia Meloni declarou que os participantes estavam dispostos a mobilizar cerca de € 10 bilhões para ajudar Kiev. Já o presidente ucraniano pediu que seus aliados invistam mais na defesa diante dos ataques russos. Ele também acusou Vladimir Putin de querer destruir “a vida em sua própria essência”, enquanto o número de vítimas civis na Ucrânia atingiu, em junho, um recorde mensal nos últimos três anos, segundo uma missão da ONU. “Os ucranianos enfrentam agora ataques com centenas de drones todas as noites. Isso é puro terrorismo”, denunciou Zelensky. O chanceler alemão, Friedrich Merz, exortou o presidente americano, Donald Trump, a “permanecer ao lado dos europeus” no apoio à Ucrânia. “Fique ao nosso lado e ao lado dos europeus. Estamos na mesma sintonia e buscamos uma ordem política estável neste mundo”, declarou Merz, acrescentando, em mensagem dirigida à Rússia: “Nós não vamos desistir”. O evento tem como objetivo político alertar para o risco de descumprimento das promessas feitas nas edições anteriores, realizadas em Lugano (2022), Londres (2023) e Berlim (2024). Nos bastidores, cresce a preocupação de que, sem mobilização internacional e, sobretudo, sem investimento privado substancial, o plano de revitalização e modernização da Ucrânia não avançará. Enquanto não houver sinais concretos de negociações de paz, investidores seguem cautelosos. BlackRock, JPMorgan e o fundo de reconstrução da Ucrânia Em 2023, o governo ucraniano incumbiu a BlackRock e o JPMorgan de estruturar um fundo internacional para atrair capital e catalisar o investimento privado na reconstrução pós-guerra da Ucrânia, reconhecendo que não conseguiria fazê-lo sozinho. A proposta previa a criação de um fundo de recuperação avaliado em mais de US$ 15 bilhões, com US$ 2 bilhões provenientes da iniciativa privada. O fundo seria registrado em Luxemburgo e administrado por um comitê de investimentos com analistas internos. Para atrair investidores considerados “mais cautelosos”, a estrutura de governança buscou incluir governos e instituições financeiras internacionais, oferecendo proteção contra riscos e tornando o projeto mais atrativo. Os recursos seriam direcionados a setores estratégicos, como infraestrutura, energia, agricultura e produção industrial. No entanto, em janeiro de 2025, a BlackRock, maior fundo de investimentos do mundo, suspendeu o projeto de captação de recursos devido à “falta de interesse”, principalmente dos Estados Unidos, que, na prática, não apoiaram a iniciativa. Essa falta de apoio está ligada à ambiguidade da posição de Donald Trump desde que reassumiu a presidência. Apesar de seu ativismo, Trump nunca assumiu uma posição clara sobre o financiamento dos esforços de defesa e reconstrução da Ucrânia, o que impactou negativamente a confiança dos investidores. Entre os governos europeus — os mais politicamente expostos no apoio a Kiev — sempre houve o receio de que a escolha da BlackRock, liderada por Larry Fink, poderia desestimular outros atores a comprometer recursos para a recuperação do país invadido pela Rússia. Solucionar essa equação financeira será o pano de fundo constante do evento de dois dias realizado no centro de congressos La Nuvola, em Roma — uma arrojada obra do arquiteto Massimiliano Fuksas, inaugurada em 2016 e projetada para se assemelhar a uma nuvem. Participantes de peso Uma delegação americana participa do evento, liderada pelo enviado especial para a Ucrânia, Keith Kellogg. No entanto, nenhum membro do governo de Washington é esperado. Estão presentes cerca de 3.500 participantes, incluindo mais de 100 delegações oficiais, 40 organizações internacionais, 2.000 empresas — aproximadamente 500 delas italianas —, além de centenas de representantes de governos locais e da sociedade civil. Os potenciais investimentos devem se concentrar em infraestrutura, habitação, energia, indústrias estratégicas, setor digital e saúde. Grandes ausentes Entre as ausências notáveis estão o presidente francês, Emmanuel Macron, e o primeiro-ministro ...
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  • Reforma em Portugal ameaça direitos de imigração e cidadania de brasileiros
    Jul 9 2025

    As mudanças incluem aumento no tempo de residência para pedir cidadania, restrições ao reagrupamento familiar e fim da regularização sem visto prévio.

    Lizzie Nassar, correspondente da RFI em Lisboa

    O debate sobre as alterações significativas nas Leis da Nacionalidade e dos Estrangeiros começaram na manhã desta quarta-feira (9), em Lisboa. Com propostas apresentadas pelo governo, pelo partido de extrema direita Chega e pelo Bloco de Esquerda, as possíveis mudanças preocupam os brasileiros, que hoje somam mais de 500 mil residentes legais em Portugal.

    Entre os principais pontos em discussão estão o aumento do tempo de residência necessário para solicitar a nacionalidade portuguesa, mudanças nas regras para o reagrupamento familiar e novas exigências para a entrada e permanência de estrangeiros no país. As propostas também incluem a criação de uma nova unidade da PSP (Polícia de Segurança Pública) voltada para a fiscalização migratória.

    Hoje, cidadãos de países lusófonos como o Brasil precisam residir legalmente por cinco anos em Portugal para obter a cidadania. Com as novas regras, esse prazo pode subir para sete anos — e, para estrangeiros de fora da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP), até dez anos. Além disso, bebês nascidos em território português só teriam direito à nacionalidade se os pais estiverem legalmente no país há pelo menos três anos — o dobro do que é exigido atualmente.

    Reagrupamento familiar sob novas restrições

    Outro ponto sensível é o reagrupamento familiar. A proposta prevê que imigrantes só poderão trazer familiares para o país após dois anos de residência legal — com exceção de menores de idade. Atualmente, esse processo é mais flexível e é essencial para muitas famílias brasileiras que vivem em Portugal.

    Além disso, o visto de busca de trabalho passaria a ser restrito a profissionais altamente qualificados, e deixaria de ser possível entrar no país como turista e posteriormente solicitar o título de residência — prática comum nos últimos anos.

    Diante da possibilidade de mudança nas regras, muitos brasileiros têm lotado os balcões do Instituto dos Registros e do Notariado para adiantar pedidos de nacionalidade. Há também um aumento nos processos judiciais relacionados à renovação de residência e ao reagrupamento familiar.

    Tramitação parlamentar e próximos passos

    As propostas ainda estão em fase de discussão na comissão especializada, o que significa que os deputados irão analisar os detalhes dos textos, mas não votarão imediatamente. O governo português afirma estar aberto a negociações para buscar um consenso no Parlamento.

    A expectativa é que o debate se encerre até o fim de julho ou em setembro. Se aprovadas, as alterações seguem para sanção do presidente Marcelo Rebelo de Sousa, que pode, inclusive, consultar o Tribunal Constitucional no caso da Lei da Nacionalidade.

    Impacto direto sobre brasileiros

    Durante o Fórum de Lisboa, realizado na semana passada, o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Gilmar Mendes expressou preocupação com o tom do debate político em torno da imigração. Ele destacou o histórico de laços entre Brasil e Portugal e afirmou confiar na capacidade de diálogo entre os dois países.

    "Espero que isso não afete as relações Brasil-Portugal. Somos sempre bem recebidos aqui, a comunidade brasileira contribui muito para o desenvolvimento do país. Nós estaremos sempre defendendo a presença de brasileiros em Portugal — assim como defendemos a presença de portugueses no Brasil", declarou Mendes.

    Enquanto o debate parlamentar avança, o clima entre imigrantes é de incerteza. As próximas semanas serão decisivas para definir o rumo da política migratória em Portugal — e, com ela, a vida de milhares de brasileiros que chamam o país de casa.

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  • Com convergência geopolítica e avanço na cooperação, Brasil e Índia reforçam aliança no Sul Global
    Jul 8 2025
    Com uma pauta ampla que inclui colaboração no combate ao terrorismo, cooperação agrícola e o papel estratégico do Brics, Índia e Brasil fortalecem suas agendas bilaterais e buscam se afirmar como alternativas à polarização das grandes potências. Nesta terça-feira (8), o presidente Lula recebe o primeiro-ministro indiano, Narendra Modi, em Brasília. Raquel Miura, correspondente da RFI em Brasília Brasil e Índia, integrantes do Brics, compartilham características marcantes: são democracias em desenvolvimento, com passados coloniais e desafios sociais e econômicos ainda significativos. A chegada do primeiro-ministro Narendra Modi a Brasília, onde firmará acordos de cooperação com o presidente Lula, reacende o debate sobre o protagonismo que essas duas nações — relevantes, mas historicamente fora do eixo das grandes potências — podem exercer no cenário geopolítico atual. Para analistas internacionais ouvidos pela RFI, Brasil e Índia simbolizam o fortalecimento do Sul Global em um momento de reorganização das relações internacionais. “Brasil e Índia, sem dúvida, fazem parte dessa tentativa de reposicionar as relações entre os países em um contexto global desafiador, em que mesmo a ordem internacional criada após a Segunda Guerra Mundial se mostrou insuficiente para resolver os problemas concretos da humanidade. Então, talvez, a solução possa vir do Sul Global, de países que nunca lideraram nenhuma ordem internacional hegemônica e que, exatamente por sofrerem com os efeitos colaterais dessas diferentes potências, conseguem pensar fora do óbvio, pensar políticas mais arrojadas”, afirma Carolina Pedroso, professora de Relações Internacionais na Unifesp. O especialista Jorge Ramalho, professor da Universidade de Brasília, ressalta que há “amplos espaços de cooperação a serem ocupados, em especial no que concerne à produção conjunta de medicamentos, ao desenvolvimento da agricultura familiar e à redução da pobreza, principalmente da fome”. Para ele, Brasil e Índia têm realidades distintas no âmbito regional, mas, quando se trata do ambiente global, há uma grande convergência de interesses. “Por estarem distantes fisicamente, há pouca possibilidade de conflitos entre os dois países. No plano geopolítico, contudo, há uma grande diferença entre a dinâmica tensa enfrentada pela Índia, em especial com relação à China e ao Paquistão, e a confortável situação brasileira. No conjunto, contudo, há interesses complementares. Os dois países têm muito a ganhar com essa aproximação e muito a oferecer ao cenário internacional, em termos de reforma do multilateralismo e de fortalecimento da governança global”, observa Ramalho. Rivalidades globais e alianças alternativas No momento em que as maiores potências, Estados Unidos e China, escancaram a rivalidade global, é possível enxergar, na relação de Modi e Lula, uma tentativa de defender a transversalidade de temas como o combate à fome nas relações mundiais e de construir parcerias em que pode haver mais de um ganhador. “A Índia é a quinta economia do mundo. O Brasil, a décima. São países que passaram por processos de colonização, que ainda têm de avançar em muitos aspectos de desenvolvimento. Por isso, a cooperação Sul-Sul — que são essas políticas de aproximação, de troca de conhecimento, de tecnologias — tende a acontecer muito mais numa lógica de ganha/ganha, em que ambas as partes podem sair beneficiadas por essa aproximação”, acrescenta Carolina Pedroso. Os Estados Unidos são o principal destino das exportações indianas, ao passo que a China — principal parceira comercial do Brasil na atualidade — é o país que mais vende para a Índia. “A relação Brasil/Índia é relevante tanto dentro do Brics quanto no cenário internacional como um todo, mas ainda não atingiu o ápice daquilo que pode se converter, tanto em termos de comércio, de investimento, como de cooperação”, pontua a professora da Unifesp. Vacinas, cultura e futuro compartilhado O especialista Jorge Ramalho lembra que a Índia se beneficiou da política brasileira da década de 1990, de negociar a quebra de patentes de medicamentos para doenças que afetam grandes parcelas da população de países em desenvolvimento, fortalecendo seu setor farmacêutico. Hoje, o Brasil tenta retomar a produção da maioria das vacinas que consome em território nacional, reduzindo, inclusive, importações de doses da Índia — o que, para ele, mostra mais confluência de temas do que adversidade. “Os dois países também têm problemas semelhantes em outras áreas, como a agrícola e a social, de modo que suas posições tendem a aproximar-se nas negociações internacionais. Em setores como o espacial e o nuclear, o Brasil tem muito a aprender com a postura da Índia, mais estratégica e consistente através do tempo. Em cada uma das duas ...
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  • Trump e Netanyahu se reúnem para discutir o futuro do conflito entre Israel e Hamas
    Jul 7 2025

    O primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, já está em Washington, onde se encontra nesta segunda-feira (7) com o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump. Com as idas e vindas, propostas, respostas e observações, a situação permite várias perspectivas e possibilidades para um acordo de cessar-fogo no Oriente Médio.

    Três temas devem dominar o encontro entre os dois líderes. O fim do conflito na Faixa de Gaza é a principal prioridade do presidente norte-americano, como ele mesmo tem reiterado publicamente. Além disso, haverá uma avaliação do novo cenário regional após os 12 dias de conflito entre Israel e o Irã, que contou com a participação decisiva dos Estados Unidos no bombardeio de instalações nucleares iranianas.

    Outro tema importante é a possibilidade de expandir os chamados Acordos de Abraão, uma das principais conquistas internacionais do primeiro mandato de Trump. Em 2020, Trump anunciou que conseguiu estabelecer relações diplomáticas entre Israel, os Emirados Árabes Unidos e Bahrein. Posteriormente, outros países aderiram a este formato de acordo.

    Até os ataques do Hamas em 7 de outubro de 2023, havia a expectativa de que a Arábia Saudita pudesse ser mais um país a estabelecer relações diplomáticas com Israel. No entanto, a resposta israelense e a tragédia humanitária em Gaza colocaram o assunto em compasso de espera. Os sauditas afirmaram que só normalizarão relações com Israel se o governo de Netanyahu abrir caminho para a criação de um Estado palestino, algo improvável na atual coalizão de governo.

    Entretanto, segundo apuração da RFI, há a possibilidade de novidades sobre os Acordos de Abraão. Uma declaração sobre o fim do conflito em Gaza pode ser tão importante quanto uma declaração sobre a criação de um Estado palestino. E isso poderia abrir caminho para mais adesões ao acordo lançado por Trump em 2020.

    Negociações indiretas entre Hamas e Israel

    Enquanto Netanyahu está em Washington, outra delegação de negociadores israelenses está em Doha, no Catar, com o objetivo de resolver as divergências após a resposta do Hamas. As diferenças entre as partes se concentram em três aspectos: o modelo de distribuição de ajuda humanitária na Faixa de Gaza, a retirada das tropas israelenses do território e a exigência do Hamas de que o cessar-fogo de 60 dias leve necessariamente ao fim do conflito. O grupo palestino quer garantias dos Estados Unidos de que isso vai acontecer.

    Após a resposta do Hamas e a reunião do Gabinete de Segurança de Israel, o primeiro-ministro Benjamin Netanyahu informou, em comunicado oficial, que as exigências do Hamas são inaceitáveis. No entanto, segundo informação obtida pela RFI, se não houvesse qualquer possibilidade de negociação, a delegação israelense nem sequer sairia para Doha.

    As famílias dos reféns israelenses foram informadas sobre a decisão de enviar uma delegação a Doha e exigem atualizações sobre o processo de negociação.

    Membro do governo israelense apela por acordo

    O ministro das Relações Exteriores de Israel, Gideon Sa’ar, pressionou abertamente por um acordo de cessar-fogo entre Israel e o Hamas.

    “Há uma grande maioria, tanto no governo quanto na sociedade, a favor do plano para a libertação dos reféns. Se houver uma oportunidade para alcançar este acordo, ela não deve ser desperdiçada!”, escreveu em sua conta no X (antigo Twitter).

    Ao mesmo tempo, apesar da maioria mencionada por Sa’ar, dois dos ministros mais radicais da coalizão se opõem ao plano: Itamar Ben Gvir (Segurança Nacional) e Bezalel Smotrich (Finanças). Segundo a imprensa local, ambos estão empenhados em impedir a aprovação deste acordo.

    Embora detenham 13 das 120 cadeiras do Knesset, é importante deixar claro que o Gabinete de Segurança, ao votar o acordo, não precisa da aprovação dos demais parlamentares. No entanto, Smotrich e Ben Gvir podem tentar derrubar o governo ao sair da coalizão.

    Diante deste cenário, o líder da oposição, Yair Lapid, voltou a se comprometer a se juntar ao governo, oferecendo uma “rede de sustentação”. Benny Gantz, líder do partido Azul e Branco, também afirmou que “nenhum bloco no mundo será capaz de impedir o retorno dos reféns”.

    “Netanyahu, a política pequena não vai ser um obstáculo para decisões históricas. Você tem uma ampla maioria para trazer os reféns de volta entre o povo e o Knesset”, disse em mensagem de vídeo.

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  • Inclusão das mulheres é essencial para o desenvolvimento econômico dos países do BRICS, aponta relatório
    Jul 4 2025

    Enquanto negociadores seguem trancados atrás de um texto de consenso para a declaração final dos líderes do BRICS, que estarão reunidos no Rio de Janeiro nos dias 6 e 7 de julho, a Aliança das Mulheres de Negócios do grupo acaba de preparar um novo relatório sobre a realidade da população feminina no bloco.

    Vivian Oswald, correspondente da RFI no Rio de Janeiro

    O documento, que será entregue aos chefes de Estado e de governo no Fórum Empresarial do BRICS, destaca a importância de sua inclusão para o crescimento econômico das 11 nações que compõem o grupo. O Relatório de Desenvolvimento das Mulheres do BRICS 2025, ao qual a RFI Brasil teve acesso exclusivo, traça um panorama atualizado que inclui os novos sócios do bloco econômico.

    O relatório é um diagnóstico da situação das mulheres a partir de indicadores de educação, saúde, participação no mercado de trabalho e no processo decisório dos países do bloco e ressalta a importância de sua inclusão para o desenvolvimento econômico.

    O documento traz um alerta interessante para estas nações em desenvolvimento do chamado sul global, muitas delas conhecidas pela mão de obra relativamente jovem — à exceção da Rússia, que já enfrenta um problema de longa data de declínio populacional.

    Fecundidade

    De acordo com dados de 2023 para os países do BRICS, as etíopes mantêm uma taxa de fecundidade relativamente alta, de 4,16 nascimentos por mulher. Mas na China, Rússia, Emirados Árabes Unidos (EAU) e Brasil essas taxas variam de 1,16 a 1,64 nascimentos por mulher, o que indica que vários países do BRICS podem enfrentar desafios futuros, econômicos, sobretudo, relacionados à queda da população.

    Entre as razões identificadas estão uma combinação de fatores pessoais e sociais, incluindo o peso financeiro de criar filhos, interrupções na carreira causadas por partos e lacunas nos sistemas de casamento e proteções de bem-estar social. Esses desafios têm levado as mulheres a pensar duas vezes antes de começar a constituir famílias, especialmente entre as gerações mais jovens nascidas nas décadas de 1990 e 2000, que dão mais ênfase à independência, à liberdade pessoal e ao desenvolvimento profissional.

    O relatório indica que houve melhoras na participação de mulheres na economia digital e nas pesquisas científicas. Mas alerta para grandes diferenças que ainda permanecem. E nos processos decisórios, as diferenças são imensas.

    A participação delas nos seus respectivos parlamentos, vai de 50% nos Emirados Árabes Unidos, 45,9% na África do Sul a 17,5% no Brasil, onde foram registradas melhoras nos anos recentes.

    No comando de empresas também é muito desigual. Na África do Sul, o país com a melhor posição, elas têm 34,9% dos cargos de chefia. Nos salários também. Enquanto os Emirados, China e Indonésia estão entre os 15 mais iguais no ranking global, os outros ainda apresentam diferenças abissais.

    Apoio à educação

    Entre as propostas que serão entregues aos líderes dos países estão a revisão de currículos escolares com perspectiva de gênero, a capacitação de professores e o estímulo à entrada de meninas em áreas como ciência, tecnologia, engenharia e matemática (STEM). O documento também sugere a ampliação de parcerias entre instituições de ensino, setor privado e governos.

    No ambiente profissional, a Aliança recomenda a criação de bancos de talentos femininos, metas de equidade de gênero nas organizações, maior transparência nos critérios de promoção e remuneração, e a adoção de políticas como programas de mentoria e horários flexíveis. E ainda destaca o fortalecimento de marcos regulatórios, a ampliação da infraestrutura digital, especialmente em áreas remotas, e a criação de mecanismos de financiamento voltados a mulheres inovadoras.

    Às vezes, são coisas que poucos reparam. Mas, quando se fala em donos de smartphones, por exemplo, os homens são 15% mais numerosos na média do BRICS.

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  • Presidência brasileira do Brics aposta em declaração final para confirmar coesão do bloco
    Jul 3 2025
    A presidência brasileira do Brics quer uma declaração final de consenso de seus líderes na cúpula de chefes de Estado e de governo, que acontece do Rio de Janeiro, nos dias 6 e 7 de julho. O documento, que ainda não está fechado, é visto como manifestação de força e unidade do bloco de 11 nações do chamado Sul Global. Vivian Oswald, correspondente da RFI no Rio de Janeiro O encontro não terá a presença dos presidentes da China, da Rússia e do Irã em princípio. Mais uma razão, na avaliação do presidente Lula, para que a declaração do grupo seja abrangente, reforce apoio ao multilateralismo, à COP30, à reforma das instituições globais e uma parceria para pesquisas e combate a doenças geograficamente determinadas. Esses são temas prioritários da agenda brasileira. Desde o início deste ano, 11 países (Brasil, Rússia, Índia e China, África do Sul, Arábia Saudita, Egito, Emirados Árabes Unidos, Etiópia, Indonésia e Irã) muito diferentes entre si discutem as questões globais em um cenário geopolítico muito mais turbulento do que nas suas duas edições anteriores, de Kazan, na Rússia, no ano passado, e de Johanesburgo, na África do Sul, em 2023. Fontes do governo admitiram que ainda existem pendências a serem resolvidas, mas que a expectativa é a de que nenhuma delas impeça o acordo de todos em torno do documento. E ele é longo. Já estaria em mais de 80 parágrafos, o que é muita coisa para esses textos diplomáticos. Haverá ainda declarações separadas para Inteligência Artificial (IA) e COP30. Este são dois temas importantes para o Brasil. Tem também a previsão do anúncio de parceria para doenças socialmente determinadas e um memorando de entendimento sobre facilitação de comércio em moedas locais. A guerra comercial de Donald Trump e os conflitos no Oriente Médio e na Ucrânia azedam o ambiente, ao mesmo tempo que tornam necessária uma posição de conjunto, até para provar a relevância do bloco. É por isso que o Palácio do Planalto quer manter o foco nas mensagens que precisam ser emitidas em prol do multilateralismo e das reformas das instituições globais, além do apoio às prioridades do grupo. Para uma fonte do governo, o Brics tem uma capacidade de lidar com as questões de maneira mais equilibrada pela sua própria conformação. "As circunstâncias de momento colocam foco sobre a capacidade do Brics se manifestar”, disse. Aliás, embora já tenha divulgado uma nota conjunta depois dos eventos no Irã, o Brics deve mencionar o conflito em um parágrafo na declaração final. O texto não deve ser muito diferente do que já saiu. Segundo negociadores, não há muito espaço para se ir muito além do que já foi dito, a não ser que haja novos desdobramentos. Líderes ausentes As ausências, de Xi Jinping, da China, e de Vladimir Putin, da Rússia, assim como a do presidente do Irã e talvez de outros líderes do mundo árabe esvaziam um pouco a cúpula, mas aumentam a pressão para que a declaração saia. A falta do russo, contra quem existe um mandado de prisão do Tribunal Penal Internacional (TPI), já era esperada. Mas não está descartada sua participação por vídeo. O que ainda atrapalha a conclusão do texto final é o mesmo tema que impediu que saísse um documento firmado por todos os chanceleres do bloco em abril desse ano no Rio. Egito e Etiópia, dois dos novos integrantes, não são favoráveis a posição consolidada no Brics (de antes de sua expansão) de que Brasil, Índia e África do Sul seriam candidatos a vagas permanentes em um conselho de segurança da ONU reformado. A avaliação do governo brasileiro é a de que é possível chegar-se a um termo comum. O tema deve ser negociado ao longo do final de semana. A programação será intensa. Estão previstas reuniões do Novo Banco de Desenvolvimento (NDB), o banco do Brics, que completa 10 anos, nos dias 3 e 4 de julho. Há também a reunião dos ministros de Finanças e presidentes de bancos centrais, no dia 5, com a participação do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, e do presidente do Banco Central, Gabriel Galípolo. Haddad ainda tem agendas bilaterais com seus homólogos da China, Rússia, Egito e Emirados Árabes Unidos. O presidente Lula, que está na Argentina, onde participa da cúpula de líderes do Mercosul, onde o Brasil assume a presidência temporária do bloco, chega do Rio nesta quinta-feira à noite, tem agenda doméstica na sexta, reuniões bilaterais no sábado (com agenda ainda a ser confirmada) e participa das sessões da cúpula do Brics no domingo e na segunda-feira. Entre países-membros, parceiros e convidados há mais ou menos 28 nações. Desses, em nível de presidente ou primeiro-ministro há a confirmação de dois terços até o momento.
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  • Mercosul fecha acordo com europeus, e Cúpula marcará 1ª visita de Lula à Argentina desde posse de Milei
    Jul 2 2025
    Nesta quarta-feira (2), na reunião prévia à 66ª Cúpula do Mercosul, o bloco sul-americano vai anunciar um tratado comercial com a Associação Europeia de Livre Comércio (EFTA, na sigla em inglês), aumentando a pressão para a ratificação do acordo entre o Mercosul e a União Europeia. Dentro da União Alfandegária do bloco, o Brasil faz uma concessão ao presidente Javier Milei para facilitar um acordo bilateral com Donald Trump. No campo político, esta será a primeira visita do presidente Lula à Argentina desde a posse de Javier Milei, em 2023. Márcio Resende, correspondente da RFI em Buenos Aires Esta edição da Cúpula do Mercosul, como é de praxe, começa na manhã desta quarta-feira com reuniões entre ministros da Economia e entre chanceleres. No final do dia, o presidente Lula chega a Buenos Aires para participar, na quinta-feira (3), da reunião de Cúpula propriamente dita. O encontro acontece num cenário de guerra comercial, com a imposição de tarifas por parte da administração norte-americana de Donald Trump, e com conflitos bélicos. Esse contexto geopolítico tem incidência direta em anúncios e decisões. Será anunciado nas próximas horas um tratado de livre comércio entre o Mercosul e a EFTA, bloco europeu formado por Suíça, Liechtenstein, Islândia e Noruega. Assim como o tratado entre o Mercosul e a União Europeia, este acordo com a EFTA já tinha sido anunciado em 2019, mas também ficou bloqueado devido ao capítulo ambiental sobre o qual os europeus exigiam garantias. Nas últimas rodadas de negociação, ainda havia pendências em capítulos como regras de origem e propriedade intelectual. Mais especificamente, a indústria farmacêutica da Suíça queria garantias adicionais de que o Brasil não quebraria patentes para produzir localmente determinados medicamentos. O Brasil aproveitou a negociação para ampliar o capítulo de compras governamentais que pode dar um impulso ao setor industrial brasileiro. O contexto internacional de aumento do protecionismo nos Estados Unidos levou os europeus a acelerarem a abertura de novos mercados. Isso impulsionou para agora um entendimento com o Mercosul que poderia ficar para o segundo semestre. O acordo a ser anunciado oficialmente nesta quarta-feira (2) abre um mercado de US$ 4 trilhões para os produtos do Mercosul. Este acordo com a EFTA também funciona como elemento de pressão para a ratificação do acordo comercial entre o Mercosul e a União Europeia, cujas negociações foram concluídas em dezembro passado, apesar da oposição de alguns países europeus. Exceções à regra para agradar Milei O Mercosul vai anunciar a ampliação da lista de exceções à Tarifa Externa Comum (TEC). Todos os produtos e componentes importados pelo Mercosul precisam pagar uma tarifa comum. Essa unificação de critérios é o que forma a União Alfandegária. Quando se criam exceções a essa regra, gera-se uma União Alfandegária imperfeita. A soma de várias exceções pode ser fatal para o futuro de uma integração comercial. Até hoje, o Mercosul tinha 100 categorias tarifárias como exceções. Agora, essa lista será ampliada a mais 50 categorias, uma ampliação de 50% nas possibilidades de reduzir tarifas. Isso permite que um membro possa negociar de forma bilateral com países de fora do bloco exceções à regra comum. Esta é uma concessão do Brasil para a Argentina com o objetivo de desmantelar o discurso do presidente Javier Milei de romper com o bloco para negociar acordos comerciais pelo mundo. Milei queria um acordo de livre comércio com os Estados Unidos, mas deve-se contentar com algo bem menor: um acordo de preferências para o qual essa nova lista de flexibilizações é fundamental. Ao mesmo tempo que Milei quer usar essas exceções para negociar com o presidente norte-americano, Donald Trump, uma lista de isenção de alíquotas, o Brasil também pode usar essas 50 novas categorias tarifárias com o mesmo fim comercial. Açúcar e automóveis Para que a soma das exceções não descaracterize o bloco, o Brasil quer aproveitar a tendência de o governo Milei aceitar negociações comerciais para incorporar dois setores que nunca fizeram parte do Mercosul: o setor açucareiro e, sobretudo, o automotivo, responsável pela maior parte do comércio bilateral entre Brasil e Argentina. Em 34 anos de Mercosul, a incorporação de açúcar e de automóveis e autopeças à TEC ficou sempre pendente, devido ao protecionismo dos argentinos que impediu qualquer avanço. O setor de açúcar ficou sempre de fora e o setor automotivo teve um acordo bilateral entre Brasil e Argentina, limitado a cotas no intercâmbio comercial, mas sem uma política comum. Esse será um dos desafios do Brasil neste segundo semestre, quando vai exercer a Presidência semestral do Mercosul. Lula pode visitar Cristina Kirchner na prisão Não haverá, sob nenhuma hipótese, uma reunião bilateral entre os presidentes Lula e ...
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